terça-feira, 30 de abril de 2019

Canções de Ninar Mesopotâmicas

 Na Mesopotâmia, cães eram
companheiros, guardiões e fiéis
caçadores. Esta placa retrata um
Mastim rosnando.
   A antiga Mesopotâmia, "a terra entre os rios", foi o berço da escrita, da cultura urbana, do estado e de muitos conceitos e instituições que moldam nosso mundo atual. Estendendo-se do tigre ao Eufrates, no que hoje é o Iraque e a Síria, a Mesopotâmia produziu belas e intrigantes obras de arte, mitos e épicos celebrando deuses e heróis, além de tratados sobre matemática e medicina.

   O Yale Peabody Museum of Natural History, apresenta a Mesopotâmia Antiga Fala, uma exposição inovadora que nos aproxima deste mundo antigo.
   Cartas sobre casamento, criação de filhos, o primeiro dia de escola, e até mesmo divórcio e adoção, demonstram que não somos tão diferentes das pessoas que viveram tão longe no tempo.

   Entre os 150 artefatos em exibição estão:
 Primeiras receitas escritas da história
humana. Entre elas, receitas de sopas e
ensopados.
   - Um relato inicial do heroico rei Gilgamesh em campanha destinada em adentrar a Floresta de Cedros e matar o monstro Huwawa;
   - Tábuas com poemas do primeiro autor nomeado na história da humanidade, oferecidos a princesa Enheduanna;
   - Livros de receitas mais antigos do mundo, com receitas de 4000 anos atrás;
   - Tábuas de astronomia com as primeiras descrições prosaicas das constelações celestes;


 Monstro Humbaba (Huwawa), protetor
da Floresta de Cedros. Tópico de muitas
representações ferozes. Conhecido por
sua voz de dilúvio e discurso equivalente
a respiração da morte.

   Também encontramos exposta uma placa mesopotâmica contendo um "ritual para fazer bebês dormirem. 
   O artefato foi encontrado em Nippur (cerca de 160 km ao sul de Bagdá), Iraque, e foi esculpido entre 500 a.C. e 300 a.C.
   Acredita-se que placas contendo canções de ninar, rituais, ou oferendas ficavam ao lado de textos e literatura mais científicos, numa biblioteca de um templo, palácio ou casa particular.

 Inscrições em escrita cuneiforme,
datadas de 490 a.C.
   De acordo com especialistas que traduziram os escritos, a tábua cuneiforme do final da Babilônia, registra uma combinação de canções e rituais que os mesopotâmicos usavam para tranquilizar seus pequeninos. Nessas canções de ninar, os pais pediam a seus bebês que ficassem calmos como água, que "pegassem" no sono como um sonolento filhote de gazela, e que cochilassem como um pastor acenando com a cabela no meio do dia.

   Junto com as canções, o texto sugere que os pais esfreguem sobre o bebê choramingando, poeira de uma rua significativa, de uma porta ou até mesmo de um túmulo (talvez representando um silênico sinistro e definitivo).
 Tábua babilônica que soletra um ritual
para acalmar uma criança chorando.
   A tábua pede paz e tranquilidade, assim como uma canção de ninar moderna, diz Eckart Frahm, professor de línguas e civilizações do Oriente Próximo na Universidade de Yale. A tábua contém uma das duas únicas musiquinhas infantis cuneiformes descobertas até hoje. 

   Estudiosos acreditam que essas palavras provavelmente se originaram na poesia popular que havia sido transmitida oralmente por anos antes de serem escritas em algum momento entre 500 a.C. e 300 a.C.
 Neste texto, Gilgamesh, o famoso 
rei mesopotâmico, se prepara para
ir à Floresta de cedros matar
Huwawa.
   Existem algumas diferenças fundamentais das modernas canções de ninar. A criança "perturbou seu pai e trouxe lágrimas aos olhos de sua mãe, sobre cujo barulho de seu choro, o Kusarikku fugiu", diz a tábua.
   Sendo assim, considera-se que não é somente pela mãe exausta e pelo amor ao bebê, que ele deve ser consolado. Eles temem que o Kusarikku (fantasma peludo em forma de bisão) seja assustado pelo barulho do choro. Os fantasmas da casa eram seres sobrenaturais volúveis. Se irritados, poderiam "fazer coisas tão terríveis que até mesmo os deuses não eram capazes de fazer", de acordo com Frahm. 


 Amuleto de alabastro representando
Lamashtu em toda sua feroz glória.
   Cantar para os bebês também era uma maneira de proteger a família. Cantar, era essencial para manter todos em casa fora do perigo.
   Acalmar uma criança era mais do que um estado de relaxamento dos pais cansados, poderiam oferecer proteção contra forças malévolas como as de demônios, caso estivessem em casa. 

   Um demônio muito temido era Lamashtu (deusa malígna que ameaçava as mulheres no parto). Acredita-se que ela roubou bebês e matou mães grávidas. Ela aparece nos amuletos como uma figura formidável: parte pássaro, parte burro, parte ser humano, com filhotes de animais pendurados em seus seios.

  O assiriologista da Universidade de Chicago, John Wee, diz o seguinte:
 Ishtar, deusa da guerra e do amor.
 Divindades são identificáveis através dos
detalhes como a coroa com chifres.
   "Não sabemos exatamente porque o bebê chorou. Seria excessivamente especulativo insistir em uma explicação médica específica. O trabalho do historiadores é colocar-se em sapatos antigos e, neste caso, apreciar como a cultura e crenças Mesopotâmicas forneceram uma razão suficientemente importante para temer a ameaça de ruído humano excessivo".

Governante alimentando o rebanho.
   Fantasmas de casas como Kusarikku e demônios como Lamashtu podem ter sido representações vívidas de medos parentais bem fundamentados durante um período em que as taxas de mortalidade infantil eram altas, e o choro poderia sinalizar um risco terrível para a vida de um bebê. Embora não possamos saber ao certo porquê um bebê estava chorando há milênios, uma música suave e uma pitada de poeira não poderiam doer.




fontes:_____________________